Este módulo é um recurso para professores 

 

Metodologias “fora da caixa”

 

A utilização de rituais de bruxaria e de vudu para forçar as vítimas do tráfico de pessoas a prostituírem-se é bem conhecido (UNODC, 2008).

As vítimas ficam convencidas de que, caso fujam ou se recusem a trabalhar antes de pagar a sua dívida, terríveis maldições cairão sobre elas ou sobre as suas famílias. As autoridades policiais trabalham com padres e líderes culturais para curar as vítimas, para que estas se sintam capazes de cooperar com o processo da justiça criminal.

Existem evidências de que alguns grupos de crime organizado utilizam mais estas práticas do que outros. Por isso, é possível afirmar que as mesmas práticas podem ser utilizadas pelos próprios traficantes de migrantes. A resposta das autoridades policiais ao tráfico de pessoas foi bem sucedida e, tanto quanto possível, devem ser seguidas abordagens semelhantes.

Caixa 15

Resolução 807/2016

A Arguida 1, originária da Nigéria, abordou nesse país uma mulher (D.) de origens humildes, prometendo trabalho e uma melhor vida em Espanha por uma taxa de 30 000 euros. Com esse propósito, D. partiu para Marrocos, onde permaneceu por quase três anos à espera que a Arguida 1 a levasse para Espanha. Finalmente, em 2009, a Arguida 1 facilitou a entrada ilegal de D. e do seu filho de cinco anos, por mar, em Algeciras (Espanha) por uma taxa de 18 000 euros. D. viajou depois para Madrid (Espanha) de autocarro, onde foi recebida pela Arguida 1. Elas imediatamente viajaram de avião para a Grã-Canária (Espanha). D. usou o passaporte de outra pessoa, o qual lhe foi dado pela Arguida 1. D. ficou alojada na residência da Arguida 1, juntamente com o marido da última (Arguido 2) e outra mulher. D. foi imediatamente forçada pelos arguidos a trabalhar como prostituta para pagar os custos da viagem para Espanha. Além disso, D. deveria pagar os custos de vida, nomeadamente (i) 125 euros pela água e eletricidade, (ii) 50 euros pela comida, (iii) 200 euros de renda. Adicionalmente, tinha que pagar 300 euros ao Arguido 3 por cuidar do seu filho enquanto estava a trabalhar como prostituta. Tanto D. como o seu filho foram fisicamente abusados de forma a forçar D. a prostituir-se. Do mesmo modo, sofreu ameaças de agressões e malefícios sobre sie os seus familiares, sobretudo através de rituais vodu. Desta forma, os Arguidos conseguiram que D. entregasse sempre a quantia total dos seus ganhos no final do dia. O Arguido 2 estava responsável pela anotação dos pagamentos efetuados.

Nota: Este caso ilustra as dinâmicas próximas entre tráfico ilícito de migrantes e o tráfico de pessoas, pelas quais os migrantes ilegalmente introduzidos podem facilmente tornar-se vítimas de tráfico de pessoas, mas também que elementos do auxílio à imigração ilegal, como por exemplo a facilitação da passagem de fronteiras, são encontrados em casos de tráfico de pessoas. Este ponto será tratado no Módulo 6. Este caso foi processado como um caso de tráfico ilícito de migrantes, mas envolvia também elementos de tráfico de pessoas. O Tribunal que tomou a decisão reconheceu que a vulnerabilidade dos migrantes (financeira, linguística, social, cultural) é a chave para o sucesso dos criminosos. Por exemplo, os rituais de vudu podem ser mais eficazes para manter a vítima refém do que o abuso físico.

Base de dados de Jurisprudência SHERLOC sobre Tráfico Ilícito de Migrantes- Espanha

Outro exemplo de “pensar fora da caixa”, com o propósito de desenvolver investigações e acusações mais robustas, é proposto pelo  Procurador italiano, Salvatore Vella (vídeo apenas disponível em italiano). Ele explica os grandes desafios provocados pela falta de intérpretes qualificados e confiáveis, sublinhando que muitas vezes se vê obrigado a recorrer a outros migrantes para fazerem a interpretação o que, embora não seja ideal, pode ser a única forma prática e disponível em certos casos. Em resposta a este desafio, Vella recomenda que as autoridades competentes lancem uma chamada para candidaturas, especificamente dirigida a oficiais responsáveis pela aplicação da lei, que sejam nativos das línguas de relevância. Ele sublinha que, considerando o grande fluxo de migrantes durante vários anos, os filhos dos migrantes que chegaram há vários anos a Itália seriam candidatos perfeitos. Eles não só falam a língua, mas também percebem a cultura dos migrantes em situação irregular, os seus medos, pressões e dinâmicas étnicas.

 
Seguinte: Intra e intercoordenação de agências
Regressar ao início