Este módulo é um recurso para professores 

 

Branqueamento de capitais

 

O branqueamento de capitais consubstancia o processo criminoso para disfarçar a origem ilegal das receitas. Por exemplo, um traficante de estupefacientes pode adquirir um espaço de restauração para disfarçar os lucros das drogas nos proveitos legítimos do restaurante. Desta forma, os lucros da droga são “branqueados” através do restaurante para que esta receita pareça ter sido obtida legalmente. O branqueamento de capitais é essencial para as operações de criminalidade organizada, uma vez que os criminosos seriam facilmente detetados se não conseguissem “fundir” o seu dinheiro ilegal em, por exemplo, negócios legítimos, no banco, ou em imobiliário. (Soudijn, 2014; Malm and Bichler, 2013)

A necessidade crucial de ocultar a atividade criminosa organizada foi abordada nos artigos 6.º e 7.º da Convenção contra a Criminalidade Organizada. O artigo 6.º impõe aos Estados partes que criminalizem o branqueamento de capitais, enquanto o artigo 7.º estabelece as medidas para o combate ao branqueamento de capitais.

A criminalização do branqueamento dos proveitos do crime previsto no artigo 6.º da Convenção contra a Criminalidade Organizada

1. Cada Estado Parte deverá adotar, em conformidade com os princípios fundamentais do seu direito interno, as medidas legislativas e outras que considere necessárias para estabelecer como infração penal, quando praticada intencionalmente:

(a) (i) A conversão ou transferência de bens, quando o autor tem conhecimento de que esses bens são produto do crime, com o objectivo de ocultar ou dissimular a origem ilícita dos bens ou ajudar qualquer pessoa envolvida na prática da infracção principal a furtar-se às consequências jurídicas dos seus actos;

(ii) A ocultação ou dissimulação da verdadeira natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens ou direitos a eles relativos, sabendo o seu autor que esses bens são produto do crime;

(b) E, de acordo com os conceitos fundamentais do seu ordenamento jurídico:

(i) A aquisição, a posse ou a utilização de bens, sabendo aquele que os adquire, possui ou utiliza, no momento da recepção, que são produto do crime;

(ii) A participação em qualquer das infracções estabelecidas em conformidade com o presente artigo ou qualquer associação, conspiração, tentativa ou cumplicidade com vista à prática das mesmas, bem como a prestação de auxílio, assistência, facilitação e aconselhamento da prática dessas infrações.

O n.º 1 do artigo 6.º da Convenção, impõe a cada um dos Estados partes que criminalize o branqueamento de capitais. A previsão da infração penal não só permite às autoridades nacionais que organizem a deteção, investigação e repressão do crime, mas também permite uma base legal para uma cooperação internacional entre as autoridades policiais, judiciais e administrativas, incluindo a assistência mútua e extradição.

A Convenção contra a Criminalidade Organizada, permite estabelecer de forma uniforme uma previsão de intolerância contra o branqueamento de capitais, que tem servido para ocultar a atividade criminosa organizada. No artigo 7.º elencam-se as medidas para estabelecer um regime interno completo de regulação e controlo dos bancos e das instituições financeiras não bancárias, bem como diligenciar no sentido de promover a cooperação e a troca de informação, quer a nível nacional, quer a nível internacional, para investigar atividades suspeitas de branqueamento de capitais.

O ciclo do branqueamento de capitais pode ser interrompido em três momentos distintos; no entanto é importante recordar que o branqueamento de capitais é um processo único. Os momentos do branqueamento de capitais incluem:

  • Disponibilização (i.e. mudança de fundos de associação direta com o crime);
  • Estratificação (i.e. disfarçar o percurso para evitar a busca);
  • Integração (i.e. tornar, outra vez, o dinheiro disponível aos criminosos, com as suas origens ocupacionais e geográficas ocultas).

O momento da disponibilização representa a entrada inicial das receitas do crime no sistema financeiro. Em termos gerais, este momento cumpre dois objetivos: liberta o agente de manter consigo grandes quantias de dinheiro obtidas ilegalmente; e integra o dinheiro no sistema financeiro legítimo. Durante este momento, aqueles que procedem aos atos de branqueamento estão na posição mais vulnerável de serem detetados, uma vez que dispor de grandes quantias de dinheiro no sistema financeiro legítimo pode levantar suspeitas.

O momento da estratificação segue-se ao momento da disponibilização, e é muitas vezes referido como de “estruturação”. Este é o momento mais complexo do percurso e, muitas vezes, envolve a movimentação internacional dos fundos ilícitos. O objetivo principal do momento da disponibilização é separar o dinheiro ilícito da sua fonte. Isto é feito através de um sofisticado processo que envolve a estratificação de transações financeiras, cujo objetivo final é ocultar a tramitação desencadeada, e quebrar o elo com a atividade criminosa original.

O último momento do processo de branqueamento de capitais é o da “integração”. Durante este momento o dinheiro regressa aos perpetradores, daquilo que aparenta ser uma fonte legítima. Os proveitos criminosos, que foram inicialmente disponibilizados em dinheiro e estratificados por um número variado de transações financeiras, estão agora completamente integrados no sistema financeiro, e podem ser usados para quaisquer fins legítimos.

Em geral, a legislação relativa ao branqueamento de capitais impõe que os destinatários dos fundos encetem os cuidados que razoavelmente se espera na transação financeira. Existem muitos casos significativos que envolvem transações bancárias internacionais, sem que se verifique a devida diligência para conhecer a identidade dos seus clientes, ou a fonte dos fundos. Dadas as ameaças da criminalidade transnacional, corrupção e terrorismo, muitos países  elevaram os esforços para o controlo do branqueamento de capitais além das entidades bancárias, a outras entidades que possam trocar ou movimentar largas somas de dinheiro (e.g. empresas que descontem cheques, entidades que transmitam capital, joalheiros, lojas de penhores, casinos, empresas de cartões de crédito, traveller’s check, e emitentes de ordens de pagamento).

O Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI) é uma entidade intergovernamental independente, que desenvolve e promove políticas para a proteção do sistema financeiro global contra o branqueamento de capitais. Em 2003, a GAFI emitiu uma atualização de 40 Recomendações para melhorar os sistemas legais nacionais, melhorando o papel do setor financeiro, e intensificando a cooperação na luta contra o branqueamento de capitais.(GAFI, 2003).

A abordagem da GAFI na identificação de países e territórios não-cooperantes, mostrou-se bem sucedida para forçar melhorias anti branqueamento de capitais, e antiterrorismo, nos sistemas de financiamento de diversos países. Através de incentivos financeiros, sanções e monitorização, a GAFI encorajou, de forma bem sucedida, os países a criarem, e aplicarem, as leis de branqueamento de capitais e a cooperarem em investigações internacionais.

Agentes públicos corruptos e branqueamento de capitais

Uma análise dos casos pela GAFI conclui que os funcionários públicos corruptos, usam os métodos de branqueamento de capitais de forma muito semelhante àqueles que são usados na criminalidade organizada. Os funcionários públicos corruptos disfarçam os seus bens através de veículos corporativos e empresas fiduciárias, e usam “testas de ferro” e procuradores para o branqueamento dos seus proveitos através de instituições financeiras nacionais ou estrangeiras. Eles recorrem ao seu poder, como as figuras da criminalidade organizada em algumas jurisdições, para adquirirem ativos estaduais, controlar os agentes de autoridade e apreender bancos. (GAFI 2011; GAFI, 2015).

De acordo com a GAFI, indicadores comuns de “bandeiras vermelhas” de atividade potencial de branqueamento de capitais, incluem:

  • Transações frequentes de quantias elevadas de dinheiro:
  •  Recurso a elevadas quantias de dinheiro quando seria comum, e mais conveniente, usar cheques;
  • Muitas transferências eletrónicas para, ou de, paraísos bancários conhecidos em todo o mundo;
  •  Levantamentos imediatos de cheques ou por cartões de débito de elevadas e frequentes quantias de dinheiro recebidas por transferência bancária;
  • Um titular de uma conta bancária que não presta a devida atenção ao sigilo relativo À identidade pessoal, ou profissional;
  • Falta de conhecimento geral sobre os negócios declarados pelo cliente;

Estes são os tipos de indicadores nas quais as instituições financeiras e os negócios que lidam com transações em dinheiro, devem considerar quando ocorrem transações financeiras fora do comum. Para além das mencionadas 40 Recomendações, a GAFI também desenvolveu 9 Recomendações Especiais para estabelecer uma estrutura básica para a deteção, prevenção e supressão do financiamento ao terrorismo ou atos terroristas. Estas 9 Recomendações Especiais, em conjunto com as 40 adotadas previamente, fornecem um conjunto compreensivo de medidas para um regime legal e institucional, contra o branqueamento de capitais, e o financiamento ao terrorismo.

 

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