UNODC estabelece parceria para enfrentar o crime organizado na Guatemala

Imagem: UNODC

29 de abril de 2010 - O Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) assinou um memorando de entendimento com a Comissão Internacional contra a Impunidade na Guatemala (CICIG), com o intuito de reforçar o trabalho da instituição em melhorar a segurança e a justiça no país. Em entrevista ao UNODC, o Comissário Carlos Castresana, da CICIG, falou sobre a situação na Guatemala e sobre a ameaça do crime organizado e da impunidade. O comissário destacou o importante papel para o qual o UNODC está sendo convocado a desempenhar em resposta a essas ameaças.

Qual é o papel da CICIG na Guatemala?

A Comissão foi criada em 2007 com um mandato específico: eliminar os órgãos ilegais e os grupos clandestinos de segurança paramilitar criados durante o longo conflito armado no país, que se infiltraram em quase todas as instituições do Estado desde o acordo de paz de 1996. Eles evoluíram de grupos de contrainsurgência para grupos criminosos organizados. Considerando que entre 97% e 98% dos crimes graves continuam impunes, nosso papel é ajudar o governo da Guatemala a desmantelar os grupos e fortalecer o sistema de justiça nacional.

Em um artigo recente, o senhor disse que o mandato da CICIG deveria ser ampliado, para abordar as questões de crime organizado e corrupção. Como o crime organizado e a corrupção alimentam a impunidade na Guatemala?

Se o mandato da CICIG fosse estendido, acredito que poderíamos ser eficientes, não só para desmantelar estes grupos, mas também para lutar contra a corrupção e, ainda mais importante, contra o crime organizado. Há uma situação de emergência na Guatemala, a partir da perspectiva da justiça e da segurança, pois o país tem instituições fracas e ineficazes, como resultado do conflito armado. O problema tem se agravado nos últimos anos, por causa do crime organizado transnacional. Portanto, eu acredito que a resposta tem que ser mais ampla, com um esforço mais amplo de toda a comunidade internacional. Tendo em vista que o problema ultrapassa as fronteiras, a resposta também deve ser mais ampla.

A Guatemala está no fogo cruzado do tráfico internacional de drogas, entre o maior país produtor e um dos principais países consumidores. Qual é o impacto do comércio internacional de drogas na Guatemala?

É difícil estimar com precisão a dimensão do tráfico de drogas na Guatemala, mas uma forte presença de traficantes foi relatada. Já tivemos infirmações sobre 800 pistas de pouso clandestinas, pelas quais as drogas da América do Sul são transportadas para América do Norte.

Há zonas inteiras com segurança fragilizada - sem exército, polícia ou qualquer outra autoridade. A situação é grave e merece atenção urgente. É importante entender que a Guatemala, bem como Honduras, El Salvador e maioria dos países da região, possuem instituições que precisam de ajuda. Como o desafio é enorme, a resposta deve ser muito forte e enérgica. Esses países não estão em condições de oferecer sozinhos uma resposta a esses problemas. E, por nossa experiência, devo dizer que esses países estão muito dispostos a receber apoio multilateral, desde que as Nações Unidas não tenham uma agenda política.

A Guatemala tem uma das maiores taxas de homicídios do mundo, e quase 80% destes homicídios são cometidos com armas de fogo. Há uma estimativa de 1,6 milhões de armas em circulação no país, mais do que uma arma para cada dez habitantes. O que, em sua opinião, pode ser feito para efetivamente "desarmar" o país e para reduzir a criminalidade violenta?

De acordo com estatísticas oficiais do Ministério da Defesa, existem 300 mil armas ilegais que circulam na Guatemala. Conseguimos que o Congresso aprovasse uma lei de armas de fogo em 2009, que era uma condição do acordo de paz. O problema agora é aplicar esta lei, pois é um processo que exige vontade política e recursos.

Além de abordar a questão da pobreza - e, às vezes, da pobreza extrema - a solução é de fato desarmar a Guatemala e recuperar essas armas de fogo. A posse de armas de fogo é um direito constitucional na Guatemala - e nós não estamos dizendo que este direito deve ser tirado, se isto é parte da cultura -, mas essas armas devem ser regulamentadas. A lei deve ser seguida, para que possamos saber que arma pertence a quem, certificando-se de que os proprietários tenham licenças válidas e sejam cidadãos honestos com plena posse das suas faculdades físicas e mentais.

O UNODC lançou recentemente um programa nacional na Guatemala para reforçar o Estado de Direito, a segurança e justiça. O UNODC e a CICIG também assinaram um memorando de entendimento para reforçar a cooperação nestas áreas. Como o senhor vê a contribuição do UNODC para enfrentar estas questões na Guatemala e quais as sinergias que o senhor vê entre o trabalho das duas entidades?

O UNODC tem o dever de intensificar a sua presença e ampliar a assistência aos Estados-Membros que estão realmente enfrentando uma situação de emergência face a uma ameaça. Se Colômbia e México, que possuem muito mais recursos financeiros, são dominados pela ameaça do crime organizado, como podem Guatemala, Honduras e El Salvador - que, por razões diferentes, têm instituições fracas - lidar com o problema?

Eu acredito, portanto, que o UNODC tem uma missão extremamente importante na Guatemala. O mandato da CICIG nos permite fazer muitas coisas, mas o UNODC está sendo chamado a prestar assistência técnica, a fim de fortalecer a capacidade institucional e de reforma legislativa, se não agora, pelo menos no médio e longo prazo. A CICIG é, por sua natureza, uma missão de curto prazo. Eu gosto de ver CICIG como um "quebra-gelo", criada para preparar o caminho, mas não para existir indefinidamente, porque o país deve em algum ponto assumir sua própria responsabilidade. Mas, certamente, uma vez terminado o trabalho da CICIG, devem haver outras entidades das Nações Unidas no país para consolidar os resultados. Em várias áreas, acredito que o UNODC e outras agências das Nações Unidas, como o UNICEF e o UNIFEM, devem ser convidadas para preencher o vazio.

Que desafios você prevê para o trabalho do UNODC e da CICIG na Guatemala?

A comunidade internacional tem investido muito dinheiro para estabilizar e levar a democracia à região. Mas a comunidade internacional também deve ter uma abordagem mais disciplinada, para que os Estados-membros não apoiem projetos de forma desarticulada - temos que coordenar todos os esforços. Há uma forte presença internacional na Guatemala, assim, por exemplo, a questão de justiça e de segurança deve ser coordenada, buscando-se o melhor parceiro possível para haver alta qualidade nos serviços, como faz o UNODC.

Assista a entrevista em vídeo (em espanhol)

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