Este módulo é um recurso para professores 

 

Tópico 5: Soluções locais, regionais e globais para a violência contra mulheres e meninas

 

No Tópico 2, foi apresentado o conceito de discriminação da Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (Resolução 34/180 da Assembleia Geral). Desde que a Recomendação Geral 19 foi adotada, pelo Comitê CEDAW em 1992, e a Declaração da Assembleia Geral sobre a Eliminação da Violência contra as Mulheres (Resolução 48/104 da Assembleia Geral) foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1993, o detalhe do que significa abordar a violência contra mulheres, como um problema de direitos humanos, tem sido reconhecido em uma variedade de instrumentos legais.

As normas internacionais de direitos humanos são feitas por acordos legalmente vinculativos – conhecidos como tratados e convenções – que dão origem a obrigações legais para os Estados que concordam em participar deles. Os órgãos de monitoramento desses tratados avaliam até que ponto os Estados estão cumprindo suas obrigações de respeitar os termos do tratado. A jurisprudência dos órgãos regionais e internacionais (por exemplo, o Comitê das Nações Unidas sobre a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres e a Corte Interamericana de Direitos Humanos), onde indivíduos trazem suas experiências de violações de direitos humanos para julgamento, também constroem entendimentos internacionais sobre o que os Estados precisam fazer para cumprir com suas obrigações, sob os termos do tratado, e garantir o gozo dos direitos humanos na prática. Os órgãos dos tratados usam essa experiência e conhecimento para fazer comentários gerais (tais como as Recomendações Gerais da CEDAW) sobre o que o tratado significa. A Recomendação 19 da CEDAW foi atualizada em 2017, pela Recomendação Geral 35, que está incluída na Leitura Avançada para este Módulo.

As normas internacionais de direitos humanos também são compostas de declarações políticas pelos representantes dos Estados, em pronunciamentos coletivos, nas resoluções dos órgãos como a Assembleia Geral das Nações Unidas, o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, e instituições regionais, como o Comitê de Ministros do Conselho da Europa, ou a Liga Árabe.

A obrigação dos Estados de prevenir, investigar, e processar a violência contra mulheres requer dos Estados a adoção de uma variedade de iniciativas legais, políticas e práticas, cujos detalhes foram definidos em sucessivas resoluções, ao nível internacional e regional, e em vários tratados regionais.

A Assembleia Geral das Nações Unidas adotou e endossou o resultado da Conferência de Pequim sobre mulheres de 1995, na Declaração final e na Plataforma de Ação de Pequim. Esse abrangente documento de políticas cobre os direitos humanos das mulheres em várias áreas críticas, incluindo mulheres e pobreza, educação das mulheres, mulheres na economia, mulheres e mídia, mulheres e o meio ambiente, bem como violência contra as mulheres.

Em dezembro de 2010, a Assembleia Geral, em sua Resolução 65/228, adotou as  Estratégias e Medidas Práticas Modelo para a Eliminação da Violência contra a Mulher no Campo da Prevenção da Criminalidade e da Justiça Penal, que representam uma estrutura abrangente para auxiliar os Estados no desenvolvimento de políticas e na execução de ações para eliminar a violência contra mulheres e para promover a igualdade entre homens e mulheres no sistema de justiça criminal.

O Modelo de Estratégias e Medidas Práticas atualizadas está organizado em torno de onze temas: i) princípios fundamentais; ii) direito penal; iii) processo penal; iv) polícia, procuradores e outros funcionários do sistema de justiça criminal; v) penas e medidas correcionais; vi) medidas de assistência e apoio às vítimas; vii) serviços sociais e de saúde; viii) capacitação; ix) pesquisa e avaliação; x) medidas de prevenção ao crime; e xi) cooperação internacional.

Além disso, em 2013 e 2015, respectivamente, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou duas resoluções sobre “Adoção de medidas contra o assassinato de mulheres e meninas por razões de gênero” (Taking action against gender-related killing of women and girls) (AQ/RES/68/191) (A/RES/70/176), instando os Estados-Membros a exercerem a devida diligência para prevenir, investigar, processar e punir atos de violência de gênero contra mulheres e meninas.

A Assembleia Geral das Nações Unidas e o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas também aprovam resoluções regulares, sobre a necessidade de os Estados intensificarem seus esforços, para combater a violência de gênero contra mulheres e meninas. A Comissão das Nações Unidas sobre a Condição Jurídica e Social da Mulher também adotaram “Conclusões Negociadas”, as quais abordaram a violência contra as mulheres, em 1998 e 2013. O Conselho de Segurança das Nações Unidas abordou a questão do estupro e da violência sexual em contexto de conflito, em uma sucessão de resoluções sobre o tema mulheres, paz e segurança. (Ver, por exemplo: Relatório do Conselho de Segurança).

Os órgãos regionais de direitos humanos também adotaram tratados e resoluções relativos à violência de gênero contra as mulheres: os três tratados regionais, na região das Américas (Convenção de Belém do Pará, 1994), na África (o Protocolo de Maputo, 2003) e na Europa (a Convenção de Istambul, 2011) são detalhadas na apresentação de PowerPoint que acompanha este Módulo. A Liga Árabe e a Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) também desenvolveram iniciativas regionais, para fazer avançar a agenda sobre mulheres, paz e segurança em suas respectivas regiões.

O mais recente e mais detalhado tratado regional é o da Europa – a Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica, conhecido como a Convenção de Istambul (2011).

A Convenção de Istambul é particularmente interessante, porque os detalhes do direito internacional vigente sobre direitos humanos, especialmente as Resoluções da Assembleia Geral das Nações Unidas e a jurisprudência dos tratados de direitos humanos internacionais e regionais, foram considerados na elaboração do texto desta Convenção. Por exemplo, como especificado no Tópico 3, a definição de estupro no Artigo 36.º teve a redação baseada em casos do Tribunal Penal Internacional para a antiga Jugoslávia e da Corte Europeia de Direitos Humanos. A Convenção de Istambul reflete os detalhes da legislação internacional de direitos humanos – retirados da jurisprudência internacional e de todos os sistemas regionais de direitos humanos – sobre a prevenção, investigação e processamento da violência contra as mulheres. É baseada, portanto, na legislação internacional de direitos humanos elaboradas ao redor do mundo, e não apenas conforme padrões regionais europeus. Na verdade, esse tratado é passível de ratificação por qualquer Estado, em qualquer lugar do mundo, não apenas pelos Estados europeus.

Existem 60 artigos na Convenção de Istambul, cobrindo todos os aspectos da prevenção, investigação, processamento e provisão de remediações às vítimas. A proteção de mulheres e meninas que estão em situação de risco, por meio de medidas de proteção, é também um aspecto da Convenção de Istambul. A Convenção de Istambul também requer que os Estados-Membros organizem suas estruturas governamentais de modo cooperativo, para que as vítimas de violência recebam uma resposta coordenada para prevenir nova violência e para proporcionar a devida reparação.

A Convenção de Istambul reconhece as obrigações dos Estados de tomarem as seguintes iniciativas:

  • Os Estados devem coordenar todas as medidas entre os vários ramos do governo local e regional;
  • Iniciativas para enfrentar a violência contra mulheres devem obter os financiamentos e recursos apropriados;
  • Os Estado devem cooperar com as organizações da sociedade civil, para desenvolver e estabelecer boas práticas para erradicar a violência contra as mulheres;
  • Os Estados devem assegurar a educação de crianças e jovens e a informação ao público em geral, para promover a igualdade de gênero e a erradicação da violência contra mulheres;
  • Os Estados devem garantir o acesso a serviços para as vítimas, tais como abrigos e linhas de ajuda telefónicas;
  • Todos os profissionais – particularmente dos setores de saúde e da justiça criminal – devem ser capacitados e o seu desempenho, monitorado, para garantir que estejam prestando um serviço eficaz para as vítimas;
  • Os meios de comunicação social devem ser encorajados a reportar sobre violência contra mulheres, de forma responsável e precisa;
  • A legislação penal deve incluir todas as formas de violência – incluindo perseguição, mutilação do órgão genital feminino, casamento forçado, aborto e esterilização forçados, bem como violência física, psicológica e sexual;
  • Os direitos civil e de família devem incluir proteções para as vítimas de violência, por exemplo, o acesso a ordens de proteção, e o reconhecimento de que o direito parental de contato com os filhos não deve ter precedência sobre os direitos e a segurança de mulheres e crianças vítimas de violência;
  • A polícia deve implementar ações efetivas, para garantir avaliações de risco imediato e medidas de proteção.

A Convenção de Istambul exige que cada Estado-Membro transforme suas leis e políticas domésticas para melhorar a prevenção, investigação e processamento da violência contra mulheres e meninas, e para melhorar os serviços especializados. Os Estados-Membros fornecem relatórios regulares sobre como estão cumprindo suas obrigações, nos termos do tratado, e transformando a situação de violência contra as mulheres em seu país. Parte dessa obrigação é tornar os detalhes desse tratado conhecidos para o público geral, a fim de que a sociedade civil, como um todo, e particularmente mulheres e meninas, saibam sobre seus direitos e possam tomar medidas para demandar a aplicação do tratado.

A dimensão de gênero do tráfico de pessoas e do tráfico ilícito de migrantes é explorada em detalhes no Módulo 13 da Série de Módulos Universitários do E4J Dimensões de Género no Tráfico de Pessoas e Tráfico Ilícito de Migrantes.

 
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