Este módulo é um recurso para professores 

 

Perspetiva macro na abordagem ao tráfico ilícito de migrantes

 

Tal como discutido noutros módulos (especialmente no Módulo 5), o tráfico ilícito de migrantes é um fenómeno com múltiplas e complexas causas. Esta é a principal razão pela qual uma resposta exclusivamente penal não será suficiente para prevenir e reprimir o tráfico ilícito de migrantes. Pelo contrário, uma estratégia eficaz  requer a abordagem das suas causas profundas (que muitas vezes coincidem com as causas da migração irregular em geral), que impulsionam a procura dos serviços de traficantes (ver Pacto Global para Migrações Seguras, Ordenadas e Regulares). As motivações económicas, sociais e políticas dos migrantes clandestinos devem ser abordadas. Como tal, é importante adotar uma perspetiva macro ao conceber respostas para combater o tráfico ilícito de migrantes. É através da promoção da paz duradoura, estabilidade política, segurança humana e desenvolvimento sustentável que o tráfico ilícito de migrantes pode ser suprimido a longo prazo (ver também Betts, 2013).

 

A Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável

A 25 de Setembro de 2015, os Estados Membros das Nações Unidas adotaram "Transformar o nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável", com 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável tem como objetivos acabar com a pobreza, proteger o planeta e garantir prosperidade, paz e liberdade a todos, e afirma explicitamente que "não pode haver desenvolvimento sustentável sem paz e não pode haver paz sem desenvolvimento sustentável". Reconhece a paz, o Estado de direito, os direitos humanos, o desenvolvimento e a igualdade como componentes integrantes de um quadro abrangente. A redução de conflitos, crime, violência, discriminação e garantia de inclusão e boa governação são elementos chave do bem-estar dos povos e são essenciais para assegurar o desenvolvimento sustentável (UNODC e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável).

Cada ODS tem objetivos específicos a serem alcançados até 2030. Para que as ODS sejam alcançadas, todos têm de fazer a sua parte: governos, setor privado e sociedade civil. As seguintes ODS são de particular relevância no esforço de prevenir e combater o tráfico ilícito de migrantes (no contexto das causas profundas nos países de origem e da procura de mão-de-obra barata nos países de destino):

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ODS 8 – Trabalho Digno e Crescimento Económico

Objetivo 8.7 -  Tomar medidas imediatas e eficazes para erradicar o trabalho forçado, acabar com a escravidão moderna e o tráfico de pessoas, e assegurar a proibição e a eliminação das piores formas de trabalho infantil, incluindo recrutamento e utilização de crianças-soldado, e até 2025 acabar com o trabalho infantil em todas as suas formas.

Objetivo 8.8 - Proteger os direitos laborais e promover ambientes de trabalho seguros e protegidos para todos os trabalhadores, incluindo os trabalhadores migrantes, em particular as mulheres migrantes, e pessoas em empregos precários.

O ODS 8 enfatiza a importância de melhorar o crescimento económico e o acesso de todos a oportunidades que permitam aos indivíduos atingir padrões de vida adequados. Embora a responsabilidade pelo cumprimento deste Objetivo recaia principalmente sobre os Estados individuais, a assistência e cooperação internacionais são também parte integrante. O ODS 8 salienta ainda a responsabilidade dos países de destino em assegurar uma regulação adequada dos seus mercados de trabalho, de modo a que os direitos dos migrantes em situação irregular, incluindo os migrantes clandestinos, sejam assegurados e respeitados, e as vias de exploração encerradas. Ao adotarem uma abordagem multidisciplinar consistente ao tráfico ilícito de migrantes, os Estados estarão a tomar medidas para alcançar o ODS 8.

O objetivo 8.7 está aqui incluído devido à relação que frequentemente se constata entre o tráfico ilícito de migrantes e o tráfico de pessoas. Os migrantes em situação irregular, ou clandestinos podem, em determinadas situações, tornar-se vítimas de tráfico de pessoas, enquanto que as pessoas traficadas podem também ser estar numa situação de migração irregular. Este assunto é abordado mais detalhadamente no Módulo 11.

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ODS 10 – Reduzir as Desigualdades

Objetivo 10.7 - Facilitar a migração e a mobilidade das pessoas de forma ordenada, segura, regular e responsável, inclusive através da implementação de políticas de migração planeadas e bem geridas.

Objetivo 10.b - Incentivar a assistência oficial ao desenvolvimento e fluxos financeiros, incluindo o investimento externo direto, para os Estados onde a necessidade é maior, em particular os países menos desenvolvidos, os países africanos, os pequenos Estados insulares em desenvolvimento e os países em desenvolvimento sem litoral, de acordo com os seus planos e programas nacionais.

O ODS 10 promove a redução das desigualdades dentro e entre Estados. Reforçar a migração segura e regular é essencial para diminuir os lucros dos traficantes de migrantes. Devido às causas de origem da migração irregular (e do tráfico ilícito de migrantes em particular), estes objetivos só poderão ser bem-sucedidos se apoiados por estratégias de desenvolvimento inclusivas e abrangentes. Além disso, é essencial reforçar a capacidade dos Estados para prevenir e combater o tráfico ilícito de migrantes, assegurar a proteção e o respeito pelos direitos dos migrantes em situação irregular e promover a cooperação entre Estados.

A Convenção das Nações Unidas Contra a Criminalidade Organizada Transnacional (UNTOC) e o Protocolo Adicional contra o Tráfico Ilícito de Migrantes por Via Terrestre, Marítima e Aérea promovem a cooperação e os esforços conjuntos para prevenir e combater o tráfico ilícito de migrantes. Os atores privados e a sociedade civil têm um papel relevante a desempenhar a este respeito; por exemplo, divulgando informação sobre o tráfico ilícito de migrantes e os seus perigos, empreendendo iniciativas educativas e fornecendo proteção e assistência aos migrantes.

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ODS 16 – Paz, Justiça e Instituições Eficazes

Objetivo 16.1 - Reduzir significativamente todas as formas de violência e as taxas de mortalidade com ela relacionadas, em todos os lugares.

Objetivo 16.2 - Acabar com o abuso, exploração, tráfico e todas as formas de violência e tortura contra as crianças.

Objetivo 16.3 - Promover o Estado de Direito, ao nível nacional e internacional, e garantir a igualdade de acesso à justiça para todos.

Objetivo 16.4 - Até 2030, reduzir significativamente os fluxos ilegais financeiros e de armas, reforçar a recuperação e devolução de recursos roubados e combater todas as formas de crime organizado.

Objetivo 16.5 - Reduzir substancialmente a corrupção e o suborno em todas as suas formas.

Objetivo 16.6 - Desenvolver instituições eficazes, responsáveis e transparentes, a todos os níveis.

Objetivo 16.7 - Garantir a tomada de decisão responsável, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis.

Objetivo 16.A - Fortalecer as instituições nacionais relevantes, inclusive através da cooperação internacional, para a construção de melhor capacidade de resposta, a todos os níveis, em particular nos países em desenvolvimento, para a prevenção da violência e o combate ao terrorismo e ao crime.

O ODS 16 centra-se na justiça, no Estado de direito e em instituições fortes. Contudo, isto não significa que os protagonistas que não são da área da justiça não tenham uma contribuição a dar. Tal como explicado no Módulo 3 e neste Módulo 4, a abordagem multidisciplinar assenta numa colaboração robusta entre vários intervenientes. O ODS 16 promove a assistência normativa, analítica e operacional em e entre Estados com o objetivo de reforçar a eficácia, a justiça e a responsabilidade das instituições de justiça criminal no combate ao crime organizado, incluindo o tráfico ilícito de migrantes e outros crimes relacionados (tais como a corrupção). Depende ainda do reforço dos direitos humanos, incluindo os direitos dos migrantes traficados, através de sistemas de justiça eficazes, justos e humanos. A UNTOC contém cláusulas para melhorar os quadros legais contra o branqueamento de capitais e desenvolver as capacidades das agências nacionais para investigar o branqueamento de capitais, quebrar os fluxos financeiros ilícitos e apoiar a recuperação de bens roubados. Cada uma destas ações aplica-se também às infrações de tráfico ilícito de migrantes. Esta é uma área em que a cooperação internacional e as parcerias público-privadas são essenciais.

Mesmo com as políticas mais abrangentes contra o tráfico ilícito de migrantes, o sucesso depende da eficácia da implementação. Ou seja, as instituições responsáveis pela execução de aspetos distintos das estratégias contra o tráfico devem operar de forma responsável, transparente e eficaz. Os profissionais devem ser devidamente formados nas suas áreas de competência e dotados dos recursos necessários ao cumprimento das suas funções. Isto requer um vasto leque de iniciativas, incluindo as de natureza legislativa, orçamental, de reforço das capacidades e operacional. A conceção e execução de políticas e programas deve, na medida do possível, prever a participação de uma vasta gama de atores da sociedade civil, contribuindo para um processo de decisão aberto, recetivo e responsável a nível internacional sobre questões relacionadas com a criminalidade.

O Protocolo Adicional contra o Tráfico Ilícito de Migrantes não é omisso em termos de esforços de desenvolvimento sustentável:

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Artigo 15 (3) Protocolo Adicional contra o Tráfico Ilícito de Migrantes

Cada Estado Parte deverá promover ou reforçar, de forma apropriada, programas de desenvolvimento e de cooperação a nível nacional, regional e internacional, tendo em conta as realidades sociais e económicas da migração e prestando especial atenção a zonas económica e socialmente desfavorecidas, de forma a combater as causas profundas da introdução clandestina de migrantes, tais como a pobreza e o subdesenvolvimento.

 
Figura 1: Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

[Proteção; Capacitação; Centrado nas pessoas; Orientado para a prevenção; Compreensivo; Contextualizado]
Fonte: Fundo Fiduciário da ONU para a Segurança Humana
 
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